quarta-feira, 10 de julho de 2013

Satisfação e bem estar social

Satisfação e bem estar social:

Nietzsche escreveu no Crepúsculo dos Ídolos que "sem música, a vida seria um engano, um erro". Concordo plenamente em gênero, número, grau e caso (como diria meu velho professor Aldo Migot). A música preenche os espaços que parecem vazios de uma maneira que talvez nem suspeitamos. Ela toca em momentos específicos da vida, nos fazendo lembrar desses eventos posteriormente. Acordes soam em tons altos e agudos ou baixos e graves, mas sempre trilhando a nossa própria trilha sonora.
 
Me recolho ao quarto rosa para escrever não sobre a música, não obstante ter introduzido esse texto com ela. Mas para falar daquilo que nos faz sentir bem dentro da nossa existência em sociedade. Ou seja, a nossa satisfação e bem estar social. Inicio com música porque escrevo em companhia dela. A música sabe ser uma excelente companhia, mas como toda a companhia, deve ser escolhida com distinção. É uma questão de gosto, alguém pode dizer! Mas nem mais o gosto é questão de gosto. O grande musicólogo, sociólogo e filósofo Theodor W. Adorno, já havia identificado esse retrocesso ainda na década de 1930. Quando ele escreve "O fetichismo na Música e a Regressão da Audição" (2005), com propriedade diz que o gosto deixa de ser um critério subjetivo entre bom e ruim e passa a ser reconhecimento. Nesse sentido, gostamos daquilo que reconhecemos e com isso regredimos na capacidade de ouvir. Mais diretamente e ousadamente, Adorno na mesma obra, diz que se ninguém é capaz de falar realmente, é óbvio também que já ninguém é capaz de ouvir. Uma crítica bastante direta sobre as músicas de rádio, e olha que ele nem conheceu os anos 2000, e nem nunca ouviu falar do funk carioca. Me divirto em pensar no que ele falaria hoje de nossos movimentos musicais, até consigo imaginá-lo se contorcendo no caixão ...
 
 Mas a música está presente em meus momentos. Pode ser um breve cantarolei desafinado, ou no rádio do carro no trajeto do trabalho, num acorde mal feito no violão, ou na companhia do meu trabalho casual na construção desses textos descompromissados.  Ás vezes escrevo ao som de sinfonias em que me divido entre o Motus primus (Adágio) e o Motus quartus (Vivace), mas sempre parando o que estou fazendo para admirar o Allegro (Motus tertius). Outras vezes em companhia das minhas bandas progressivas preferidas como: Pink Floyd; Jethro Tull; Rush; Emerson, Lake and Palmer etc. Hoje, no entanto, estou variando entre clássicos do Rock nacional e internacional, o que me levou a composição dessas linhas. Foi os acordes conhecidos em Tom Lá Maior de Satisfaction do Rolling Stones que me incentivou a escolher o tema de hoje.
 
Satisfação não está diretamente ligada as necessidades. Nos satisfazemos também naquilo de que não necessitamos. Isso é possível? Evidente que sim! Somos campeões de querer satisfazer aquilo que não necessitamos. Estamos sempre criando novas necessidades que nem são tão necessárias assim. É natural do ser humano. Mas, de qualquer forma, o homem é o único animal  que extrapola as necessidades básicas. Necessitamos muito mais do que comida e água. E aqui mais uma vez nos valemos da nossa companheira: a música. Dessa vez  Titãs nos dá a luz, na sua clássica "Comida". 
 
Criamos sentido para nossa existência na criação de novas necessidades. Precisamos de arte, precisamos de expressão, precisamos nos sentir parte de algo, do todo, do universo... ou simplesmente sentir que somos donos da nossa própria vida. Isso também é ser humano. Isso faz parte do nosso eterno "tornar-se"...
 
Um exemplo bastante evidente disso podem ser encontrados em nosso cotidiano. Basta observarmos com atenção. Grande parte das mulheres não resistem a uma vitrine de calçados e bolsas. Entram na loja como se tivessem encontrado um poço de petróleo. E isso não é uma crítica, e não estou sendo irônico. É uma forma de satisfação, e acho bastante bacana isso. Lembro que Humberto Gessinger, em um dos seus livros, escreve que todas as lojas de instrumentos musicais de Porto Alegre tem a marca do seu nariz nas vitrines. Acontece o mesmo com os "ratos de livrarias", com os maníacos por cinema, colecionadores de revistas , de selo etc...
 
Criamos necessidades, nada mais natural do que satisfazê-las! Nisso consiste uma nova configuração social que vem crescendo desde a década de 1920: a sociedade do consumo. Essa é a consequência que temos que enfrentar, mas com a perspectiva de que isso faz parte da nossa própria natureza. Abusem das vitrines, mas não se esqueçam de que somos nós mesmos que estamos no comando. O consumismo nasce da falta de controle de nossa própria satisfação. O que significa dizer, sinteticamente, que somos controlados por aquilo que desejamos...e é exatamente isso que devemos evitar. Nosso bem estar social depende disso, mas contraditoriamente depende também da nossa satisfação... Tudo envolve uma questão de consciência.
 
Abraço a todos.  

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Sentimentos e Expressão.

Sentimentos e expressão:


Quando o trabalho me estressa eu me "desestresso" trabalhando. Contraditório? Totalmente! Mas, também necessário. E isso, por mais estranho que pareça, tem a ver com o sentimento. Não, não o sentimento de culpa, e nem o sentimento de dever ou algo do gênero. Sentimento na sua origem grega, no seu âmago, no seu mais completo significado. 
 
Sinto necessidade de me expressar, mesmo que isso não leve a nada. Na adolescência fazia canções, inventava letras e músicas. Tenho quatro cadernos de composições, com letras e músicas que falam de diversas coisas, mas antes de qualquer coisa, falam de mim, dos meus sentimentos, ou mais acertadamente, da interpretação que eu faço das coisas e dos sentimentos. E aqui nos deparamos mais uma vez com essa palavra enigmática que todo mundo conhece mas ninguém sabe explicá-la ao certo. Pode até ser que ela ainda esteja esperando uma tradução adequada, não sei, não sou filólogo. Mas o sentimento é o "pathos" grego, algo que pode ser interno (como uma dor na alma, ou uma alegria) ou externo (uma pancada doída, uma unha encravada etc)...Pathos é uma palavra grega que significa paixão, excesso, catástrofe, passagem, passividade, sofrimento e assujeitamento, o que envolve um sentimento de uma forma geral...
 
Estamos sempre oscilando em sentimentos diversos que vão da raiva à preguiça, da alegria ao desejo, do ódio à insatisfação... Somos seres passionais por natureza, e isso determina a nossa própria conduta. Isso quer dizer que nossos sentimentos, de certa forma, nos determina. Se estou cansado ou chateado com algo, minha ação ou pré-disposição para certas coisas são afetadas diretamente. Se estou contente, feliz ou simplesmente "bem com a vida", minhas ações e pré-disposições são diferentes, muito mais ativas, o que permite também, uma maior possibilidade de sucesso na realização de qualquer coisa que se queira fazer. 
 
Para tirar o estresse, acabo por vezes trabalhando em coisas alternativas como contos, poesias (que nunca são poéticas suficientes para se mostrar), ou mesmo textos como este que estou escrevendo: totalmente descompromissado. No intervalo de correções de provas, lançamentos de notas, preparações de aula ou na digitação de livros, acabo por extravasar meus sentimentos em outras direções, em outras coisas que soam mais intimistas para mim. Um toque de violão, um pensamento desconectado, uma frase de efeito... Tudo envolve um sentimento e tudo isso, ao mesmo tempo, pode ser considerado um trabalho. Essa é uma das vantagens de se trabalhar no que gosta. Apesar de todo o trabalho, existe o fato de fazê-lo para descansar, como acontece muitas vezes ao ler um livro para relaxar o corpo. É descanso, mas é trabalho. Um descanso trabalhado, ou um trabalho descansado, podem escolher!
 
Por alguma razão me lembrei de um escritor que admiro muito. Me refiro a Moacyr Scliar, que se refere com frequência a essa diferença bastante substancial no trabalho de um escritor. Ele diz que quando está mexendo no quintal, cuidando das flores, tirando ervas daninhas, aparece um vizinho e diz, com aquele sorriso forçado em tom de deboche "Trabalhando um pouquinho heim!", para esse ele responde. - "Não, descansando!". Já em outro momento, o nosso querido escritor está sentado na varanda lendo um livro, o mesmo vizinho enxerido passa e fala: "Descansando heim!" e nisso Scliar responde: "Não, trabalhando." 
 
O trabalho do professor, em parte, é muito semelhante ao trabalho de um escritor. Leituras, novos conhecimentos, estímulo da própria curiosidade são essenciais na minha profissão. Acontece que muitas vezes são entendidos como lazer e não trabalho. Ficava extremamente irritado com minha mãe ou com alguém quando eu estava lendo, e eles acusavam que eu não estava fazendo nada, ou assim pensavam. Chegava a ser um absurdo quando minha mãe falava: "larga esse livro e vai estudar", mas seja louvada a contradição, afinal é coisa de mãe (e como costumam dizer, mãe é tudo igual só muda de endereço).

 De qualquer forma, é um julgamento precipitado de nós profissionais da área de ensino e pesquisa. Para ser sincero, ainda me irrita quando esse julgamento é feito; é quase uma estigmatização na minha opinião. O fato de eu ler, não significa exatamente que eu esteja descansando, ou em um momento de lazer. Faz parte do meu trabalho. Envolve também sentimento e, mais do que isso, envolve expressão. Toda a arte por si só é expressão, seja ela qual for. Se for expressa no corpo, na tela, na música ou nas letras... expressão é sentimento e sentimento sempre vai ser paixão...  O quarto rosa é testemunha... e minha circunstância também é...
 

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Linguagem e linguagens...

Linguagem e linguagens...

Estou aqui, sentado no quarto rosa, dando continuidade ao meu segundo livro, ouvindo o álbum Clockwork Angels do Rush. De repente me bate aquela vontade louca de escrever descompromissadamente, sem normas, sem rigor científico, sem seguir nenhum protocolo...
 
 Por uma razão que nem sei me vejo pensando na dimensão da linguagem. Algo tão trivial e tão essencial. A linguagem transita pelo paradoxo. De uma maneira usual é simples, debochada, descompromissada (como minha vontade de escrever - simplesmente para que as ideias possam sair), mas pelo lado existencial ela é profunda e a principal responsável pela nossa humanidade. 
 
Parece bobagem que algo como a linguagem nos faça humanos. Mas é essa bobagem que permite todo o significado do mundo. Significado que só o homem pode dar... Mas o engraçado é pensar que tudo isso me veio a cabeça numa pausa de um trabalho, ao som do Rush... Será que isso não mostra também a grandiosidade da linguagem e quão tão longe ela pode chegar? Sinais de fumaça, notas musicais, graves e agudos, escrita cuneiforme e teclado digital... que diferença faz se a placa é de trânsito ou de vídeo? A linguagem tudo permeia e o mundo não é mais nada do que interpretação. 
 
Me pergunto agora se vou tomar um refrigerante barato, imitação das braba de marcas mais famosas, ou se vou tomar outra cuia do meu mate amargo. Opto pelo chimarrão, me faz lembrar de casa, da minha terra saudosa e me faz pensar que até mesmo esse simples gesto está impregnado de linguagem, de significado e de história...
 
As palavras saem sozinhas, não querem se tornar poesias, mas todo o pensamento traz consigo um pouco de poesia, um pouco de ânsia de exterioridade, um grito sufocado à procura de liberdade. Liberdade que só é possível também por intermédio da linguagem, que se veste de outras linguagens diversas para se fazer entender... Pode aparecer pintada numa parede, num quadro famoso, na melodia de uma canção, nas linhas mal escritas de um livro qualquer, ou ainda na distorção desafinada de uma guitarra. Incrível como a linguagem se faz entender até mesmo quando se mostra muda... Mas quem disse que o silêncio não pode dizer o que os outros querem ouvir? Ou o que ninguém nunca disse? Sei lá, é tudo tão estranho quando o mundo à noite se passa num quarto rosa....
 
De qualquer forma, de volta ao trabalho, me despeço com uma interrogação para que vocês possam matutarem por aí, embora todos nós já saibamos a resposta. Não obstante, o que é legal mesmo é perguntar, então lá vai: Como seria um mundo sem linguagem? Abraço a todos.
 
Ps. Fica a sugestão do disco, vale muito a pena ouvir Rush na calada da noite.
 
    

Apresentação

Apresentação:
 
Este blog foi criado com um fim bastante específico e ao mesmo tempo simples: a livre expressão. Não possui um fim acadêmico, apesar de trazer "Professor" acompanhado do meu nome, e nem tem a pretensão de ensinar algo, mas sim de compartilhar. Compartilhar emoções, leituras, experiências, pensamentos que pululam o intelecto querendo se manifestar de maneira direta, sem máscaras, perfumes e cremes hidratantes, da maneira mais natural possível... Escrevo para mim e para aqueles que como eu necessitam ou compartilham de momentos em que a interioridade quer se ver na exterioridade e o faço da forma mais intimista possível, explorando o meu próprio pensar, meu próprio interior que quer se exteriorizar...
 
                                                                                                                   Maicon Martta
                                                                                                                      04/07/2013